Ao ler este livro, pelo qual me apaixonei instantaneamente, relembrei alguns dos momentos que passei na Guiné, quando visitei a R., e fiquei cheia de vontade de os partilhar aqui.
As viagens em África são, por si só, uma narrativa. São muito mais do que simples trajectos entre dois pontos. São longas, quase sempre. Apinhadas, muitas vezes. E são experiências de convivência humana únicas, que transformam a mais excitante viagem europeia numa insípida rotina.
Foi, assim, que me apercebi de que as recordações mais marcantes dessa minha única (e, espero sinceramente, não a última) incursão na África negra são as recordações de viagem. Mais do que os dias passados no magnífico paraíso natural que é o arquipélago dos Bijagós, recordo a viagem de ida, numa sexta-feira santa, num barco que habitualmente transportava peixe e estava, naquele dia, apinhado de habitantes de Bissau em visita aos parentes das ilhas.
Foi uma viagem de onze horas, depois de três à espera no cais, sempre ao ritmo da música da banda do cantor guineense Justino Delgado, que viajavam connosco e tocou ininterruptamente, enquanto o barco inteiro dançava. Um pormenor que retive foi de um dos meus companheiros mais próximos ter feito um cotonete com uma pena arrancada a uma galinha que alguém levava e estar tranquilamente a limpar os ouvidos mesmo ao meu lado.
Foi uma viagem memorável, só suplantada pelo regresso, feito numa canoa, acompanhados por um grande porco que não devia gostar de viajar por mar, porque estava deitado e nem se mexia. Lembro-me da absoluta felicidade que senti nesse dia, de pés na água do Atlântico, enquanto a canoa deixava as ilhas (embora tenha decidido tirar os pés da água quando passou, bem perto, uma barbatana suspeita).
Outro momento inesquecível foi a ida de Bissau para Buba, num "toca-toca", as tais carrinhas de nove lugares que partem quando estão cheias e onde tudo se partilha. Não faltou também a viagem no jipe cooperante último modelo. O regresso foi mais convencional, numa carrinha, mas com as emoções à flor da pele, porque tínhamos cumprido a nossa missão de entregar a um guineense, antigo combatente português, que esteve preso nove anos depois da independência, uma carta e várias encomendas que lhe tinham sido enviadas de Portugal pelo seu comandante.
Talvez pela minha amostra de experiência africana, foi realmente um prazer ler este livro, que serviu de pretexto a este modesto relato de viagens. Todas elas acompanhadas de muito tempo, muita conversa e muitas pessoas que se vão conhecendo em cada momento, que nos perguntavam sempre pela família, por Portugal, e mandavam saudades e recados para os conterrâneos cá emigrados.
2 comments:
Nunca fui a África nem é viagem que me interesse particularmente, ou interessava, antes de ler este teu relato.
Quem sabe se nas próximas férias vou à Guiné-Bissau?
Cá para mim andasvas a fumar daqueles cigarros!!! Um porco numa canoa???
RS
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