Friday, February 23, 2007

Somos filhos da madrugada

Pois é, somos todos filhos de uma qualquer madrugada. Eu, que ainda nasci na noite escura do fascismo, prezo muito a madrugada que o 25 de Abril trouxe. E dessa madrugada faz, indubitavelmente, parte a música de Zeca Afonso. O "Grandola" é, para mim, símbolo de luta pela liberdade e da coragem que foi preciso ter para fazer o 24 e o 25 de Abril (porque a verdade é que hoje conhecemos o desfecho, mas os capitães não podiam ter a certeza de que tudo ia correr pelo melhor).

Percebo que Zeca Afonso seja amado por uns e menos amado por outros, precisamente pela associação tão forte à sua posição política e ao 25 de Abril. Mas isso só faz sentido para aqueles para quem essa data tem algum significado. E, dado que a maior parte dos jovens de hoje não parece sequer saber o que foi a ditadura e a revolução que acabou com ela, não há razão para gostarem ou desgostarem de Zeca Afonso por isso.

Sendo assim, sobra a obra musical, à qual, aparentemente, não se liga grande importância. Os músicos mais jovens actuais não consideram Zeca Afonso uma referência; para os mais antigos parece ser um passado já distante, algo que diz respeito a uma fase já passada das suas carreiras. E é injusto. É injusto porque a música tradicional portuguesa é diversa, rica e muitíssimo adaptável a novos contextos. É injusto porque Zeca Afonso, dizem os especialistas, inovou e abriu novas portas neste campo. E, depois, não deixa de ser curioso que quem se ouve por aí a cantar as suas músicas sejam precisamente os filhos daqueles que tiveram de fugir para o Brasil no pós 25 de Abril, que votam à direita (direitíssima...) e que cantam a "Maria Faia" lado a lado com o fado marialva. Ironias...

1 comment:

fungaga said...

DEixo um comentário, que me chegou por mail

"Eu gosto muito do Zeca. Talvez por ter crescido a ouvir algumas das suas músicas...ou, se calhar, porque sou realmente um filho da revolução...ou, se calhar, porque refilão como sou, se tivesse nascido uns anos dentro era capaz de já estar ali para os lados do Chiado ou numa estância balnear africana!
Todos, ou quase todos, os anos festejo o 25 de Abril. Aproveito os concertos de Loures ou de Almada. Canto sempre, com emoção, o Grândola à meia noite. Como me casei num 24 de Abril...não dava para ir a um concerto. Mas a coisa resolveu-se e, lá para as 4 da manhã já do dia 25, a festa acabou com os resistentes a cantar o Grândola. Aos amigos que nos acompanharam, obrigado por mais esse presente!
Quando a semana passada ouvi que fazia 20 anos da morte do Zeca, fui buscar o CD ao armário do Concerto no Coliseu (o último, que pena tenho de lá não ter estado!) e ouvi, ouvi duas ou três vezes. E mais, na partilha (pirata, claro) que faço com alguns amigos, mandei-lhes as músicas com "ordem" para ouvirem.
Termino, dizendo que me irrita quando as pessoas dizem que o Zeca acaba por ser esquecido porque estava muito ligado à política. Gaita! Mas isso não é bom? Estar ligado à política não é fazer algo pela "coisa" pública, dizer o que se pensa, tentar mudar o que se pensa estar mal? E isso não é bom? Não baralhemos política com alguns maus políticos.

pedro (é como por vezes assino quando deixo uns comentários por aí no blogesfera)"